Por que lemos?
Recentemente participei da “Cúpula Virtual da Publicação Digital”, uma conferência virtual, ou seja, uma conferência na qual você ouve os apresentadores pelos alto-falantes do seu computador, e digita suas perguntas para serem respondidas no final.
Foi uma experiência muito bacana, aprendi muito, mas não concordo com tudo o que ouvi. Principalmente o conceito de que lemos para escapar, ou prevenir dores. Esta idéia me deixou perplexa, não que talvez não toque num ponto interessante, mas a maneira como foi apresentada, como razão absoluta, me incomodou bastante. O palestrante, Sr. Jim Edwards disse: “As pessoas lêem ficção para escapar de dores, e não-ficção para evitar dores.”
O apresentador segue dizendo que ao ler ficção queremos esquecer a nossa realidade. E lemos não-ficção para: ganhar dinheiro; poupar dinheiro; economizar tempo; evitar esforço; ter sucesso; ser popular; sentir amor; e encontrar sucesso social. Durante aquela palestra tive a impressão de estar num seminário de auto-ajuda. É claro que eu leio livros para melhorar no meu trabalho ou, por exemplo, para aprender novas idéias sobre como ser mais organizada, mas eu prefiro abordar estas leituras sob uma perspectiva positiva.
Acredito que lemos ficção por prazer, e não-ficção para aprender, e para nos mantermos atualizados. Uma pesquisa recente da Pew Internet realizada nos Estados Unidos, com 2.986 entrevistados de 16 anos para cima, concluiu que as principais razões pelas quais lemos são as seguintes quatro: por prazer, para acompanhar eventos atuais, para pesquisar sobre temas específicos que nos interessam; por trabalho ou estudo.
Razões básicas porque as pessoas lêem
Os entrevistados citaram uma variedade de motivos para a sua leitura, especialmente quando se trata de conteúdo em formato longo, como livros ou artigos de revistas. Apesar de pessoas diferentes citarem suas razões de maneiras distintas, todas puderam ser classificadas nas quatro categorias abaixo. • 80% dos entrevistados de 16 anos para cima dizem que lêem pelo menos ocasionalmente por prazer. As mulheres (84%) são mais propensas que os homens (75%) a citar este motivo. • 78% dizem que lêem pelo menos ocasionalmente, para acompanhar eventos atuais. Esta razão é mais citada entre os entrevistados acima de 30 anos de idade. • 74% dizem que lêem pelo menos ocasionalmente, para pesquisar temas específicos que lhes interessem. Entrevistados com menos de 65 anos são mais propensos a citar esta razão. A questão da idade está parcialmente ligada ao fato de, proporcionalmente, menos idosos estarem no mercado de trabalho. Os pais com filhos menores (80%) são mais propensos do que os não-pais (72%) a mencionar esta razão para sua leitura. • 56% dizem que lêem pelo menos ocasionalmente, por trabalho ou estudo. Trabalhadores e estudantes dominam esta categoria, mas há algumas surpresas nos dados. Deste total, 23% dos trabalhadores em tempo integral dizem que nunca lêem nada relacionado ao trabalho ou ao estudo. Aqueles que têm níveis mais baixos de renda familiar e educação destacam-se nesse grupo dos que não lêem, nem por trabalho nem por estudo. Cerca de 50% dos trabalhadores em tempo integral dizem que lêem todos os dias, ou quase todos os dias, materiais relacionados aos seus empregos ou a escola; outros 16% lêem por trabalho ou estudo uma ou duas vezes por semana; outros 10% dizem que fazem essa leitura menos frequentemente do que isso. Os homens (58%) são mais propensos do que as mulheres (53%) a dizerem que lêem por razões relacionadas ao trabalho ou aos estudos. Os menores de 65 anos de idade são consideravelmente mais propensos a citar esta razão, em comparação com os idosos. Isto também está ligado ao fato de que, proporcionalmente, menos idosos estão no mercado de trabalho. E os pais (68%) são mais propensos do que os não-pais (48%) a dizer que lêem por este motivo. Você pode ler mais sobre esta pesquisa clicando aqui. |
Considerando-se não-ficção os dados acima são bastante explícitos e satisfatórios, mas para ficção eu prefiro as palavras de Robert Penn Warren. Em seu ensaio para o “Saturday Evening Post Society” em 1986 “Por que ler ficção?”, ele escreveu, “Por que lemos ficção? A resposta é simples. Lemos porque gostamos. E gostamos porque a ficção, como uma versão da vida, estimula e gratifica nosso interesse por ela. Mas qualquer que seja o apelo de uma obra de ficção, o interesse imediato e especial que nos leva a ela é sempre nosso interesse por uma boa estória.”
E ele toca no âmago do prazer que eu encontro em ficção quando diz: “A ficção nos oferece uma versão aumentada da vida onde tudo é novo, e temos a oportunidade de desafogar de maneira desinibida a grande carga emocional – lágrimas, riso, ternura, empatia, ódio, amor, e ironia – que fica guardada dentro de nós, presa no circuito fechado do torpor cotidiano. Além disso, esta consciência aumentada pode ser plenamente desfrutada, pois o que em realidade seriam ameaças de grandes problemas ficam aqui restritos à mera imaginação, e porque algum tipo de resolução do dilema é, devido a própria natureza da ficção, garantido.”
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Concordo com tudo que vc disse. Nem todo mundo ler para fuga.